Este blog foi criado com o objetivo de compartilhar ideias e conhecimento com você, que costuma passar por aqui. Portanto, sinta-se à vontade para postar comentários e me ajudar a melhorar o conteúdo desta página. Aqui os posts sobre arquitetura e urbanismo predominarão, mas assuntos frequentes sobre história, música e fotografia poderão aparecer... E além disso, pretendo compartilhar algumas experiências em eventos acadêmicos, viagens e afins. Obrigada.

@jessicarossone

sexta-feira, 29 de abril de 2011

Tratado De Architectura IV

                    E como continuação do livro terceiro, me proponho a resumir e comentar este livro. Tive a impressão de só agora entender as ordens, apesar de já ter estudado isso há um ano ou mais. A quantidade e qualidade de informações sobre as ordens dórica, jônica e coríntia, além de comentários sobre os templos toscanos são imprescindíveis. 

LIVRO IV

"Essas cidades, tendo espulsado os habitantes de Cária e os léleges, apelidaram de Jônia essa região, do nome de Ìon, seu chefe, e aí, estabelecendo lugares sagrados dos deuses imortais, começaram a edificar templos. E levantaram em primeiro lugar um santuário de Apolo Paniônio, como tinham visto na Acaia, e chamaram-no de dórico, porque viram primeiramente um templo desse gênero nas cidades de Dóride."

     Assim explica Vitrúvio a origem mitológica da ordem dórica, a primeira das ordens a ser formada e que deu origem às ordens jônica e coríntia. A relação da ordem dórica com o corpo masculino foi esplanada também de modo mitológico: querendo eles colocar as colunas nesse templo, mediram com exatidão a planta do pé viril e a reproduziram seis vezes em altura, incluindo o capitel. Alguns arquitetos antigos afirmaram não ser conveniente construir templos sagrados seguindo a ordem dórica, pois nela os módulos se tornavam defeituosos e discordantes e era dificultosa a distribuição dos tríglifos e lacunários.



Partenon em junho/2014


 Da mesma maneira diz da relação da ordem jônica com o corpo feminino: Quando levantaram um templo a Diana, procurando um novo estilo, levaram para a mesma planta a delicadeza feminina e dispuseram o diâmetro da coluna segundo a oitava parte da sua coluna, para que fosse mais elevada. Na base, colocaram uma espira que imitava um sapato; no capital, volutas, como se fossem caracóis enrolados pendentes de uma cabeleira. Foi criada pelos jônios e por isso seu nome.

     Sobre a ordem coríntia e sua relação com a graciosidade da donzela: "apresenta-se com delicadeza virginal, porque as donzelas, a mercê da sua tenra idade, possuem uma configuração de membros mais grácil e conseguem no adorno os mais belos efeitos." Encantados com a aplicação de módulos mais gráceis, constituíram a ordem coríntia, que possui as mesmas comensurabilidades que as jônicas, â exceção dos capitéis e da altura, pois apresentam um aspecto mais esguio. Vitrúvio atribui ao escultor Calímaco a confecção do capitel coríntio.


Templo de Zeus em junho/2014

     A antiga obra de carpintaria partia de uma base segura assumida das verdadeiras leis da natureza. A partir dessas leis, eles transferiam tudo para os acabamentos das obras e aprovavam apenas aqueles que se fundassem em uma verdadeira lógica. Os antigos carpinteiros ordenaram os espaços entre o madeiramento e, com obra de carpintaria, aperfeiçoaram os entablamentos dos templos, dando-lhes um aspecto mais agradável. A partir daí tiveram origem os tríglifos, os mútulos, as métopas e os dentículos.
     Não obstante, depois de tratar da parte exterior dos templos, Vitrúvio falou sobre a cela, o pronau e suas portas, além de falar sobre o altar. O comprimento do templo era o dobro da largura, e a cela deveria ser um quarto mais longa que larga, incluindo as paredes onde ficariam as portas. Os três quartos restantes são para o pronau. As portas eram classificadas em três estilos: dórico, jônico e ático. Sobre o altar, deveria estar disposto de modo que as estátuas sempre ficassem em cota maior e orientadas para o oriente (caso parecido com a explicação da orientação dos templos, logo abaixo).
     Sobre a orientação, tema que considero importante pelo fato de estar ligado às crenças e religiões, os templos e as estátuas deveriam estar orientados sempre para a região vespertina, de modo que os que vão fazer seus sacrifícios olhem para o sol nascente quando olharem para a imagem que estiver no templo. Se houvesse alguma restrição, devia se orientar o templo de modo que parte da cidade possa ser avistada. Ou, se estivesse próximo a um rio, deveria estar orientado de forma que se pudesse avistar a sua margem.

                    Talvez estes sejam os assuntos mais comuns estudados por disciplinas como História, História da Arte, História da Arquitetura ou Patrimônio Histórico. Considero fundamental conhecer tais ordens para compreender manifestações artísticas que remetem à Antiguidade Clássica. Correntes como o Renascimento e o Neoclassicismo somente são compreensíveis se houver um estudo prévio destes assuntos. Adorei estes dois livros. Espero que os próximos sejam tão interessantes como este foi para mim.

sexta-feira, 22 de abril de 2011

Tratado De Architectura III

                    E como eu estivesse muito interessada pelos próximos livros do tratado vitruviano (e isso é verdade), acabei por me deleitar e analisar exaustivamente cada parte, passando dois dias para compreendê-las. E achei justo também juntar informações dos livros terceiro e quarto, para que assim, não tenha que citar repetitivamente cada ordem ao caracterizá-la. Na sua conclusão sobre a arquitetura dos templos, Vitrúvio resume os tópicos que analisou como doutrinas sobre os tempos sagrados, distinção das ordens, comensurabilidades das suas proporções, disparidades dos planos. Na verdade sua análise foi muito além disso, falando de formas, cálculos e sobre as reações que as diferentes ordens e suas características causavam nas pessoas.

LIVRO III

     Vitrúvio começa seu terceiro livro falando sobre a composição e sua relação com a comensurabilidade dos templos: a proporção consistindo na relação modular de uma parte dos membros em cada seção ou na totalidade da obra, a partir da qual se traça o sistema das comensurabilidades. Assim, como foi citado, igualmente acontece com as proporções do corpo humano. Quando fala sobre a relação da circunferência e do quadrado com o corpo humano explica a relação entre corpo humano e as ordens edificáveis de forma mais clara. "Os membros dos edifícios sagrados devem ter em cada uma das partes uma correspondência de medida muito comformemente, na globalidade, ao conjunto da magnitude total. (...) Igualmente, assim como o esquema da circunferência se executa no corpo, assim nele se encontra a figura do quadrado."
     A ideia de um número perfeito, que existiu tanto na Grécia Antiga quanto em Roma em sua época, foi pensada a partir da percepção do corpo humano e parecia um sistema necessário em todas as obras. Para os gregos, o número perfeito instituído era o dez, ideia que também agradava Platão, pois tal número era obtido a partir das coisas singulares, chamadas pelos gregs de monades. Para os matemáticos, o número perfeito era o seis, porque contém repartições, que segundo suas contas, se ajustam a esse número. Para os romanos, era considerável perfeito também o número dez, mas depois, ao darem conta da perfeição tanto do número dez quanto do seis, resolveram somá-los e assim estabelecer como número perfeitíssimo o dezesseis.
     As tipologias de templos, de acordo com seu alçado, eram: in antis ou naus en parastasin; depois prostilo, anfiprostilo, períptero, pseudodíptero, díptero e hipetro.

                  Apesar de lançar de uma só vez os tipos de templos e de suas distinções poderem ser feitas com poucas palavras, Vitrúvio se preocupa em explanar cada tipo pormenorizadamente. Resumindo:
In antis: com pilastras; naus en parastasin: templo com muros terminando em pilastras; prostylos: com colunas à frente; amphiprostylos: com colunas à frente e atrás; peripteros: com colunas em volta; pseudodípteros: de falsa ala dupla; dipteros: de ala dupla; hyphaethros: a céu aberto.
                 
     De acordo com os intercolúnios, a classificação dos templos era feita em cinco "espécies": picnostilo, ou seja, de colunas cerradas; sistilo, um pouco bastas; diastilo, mais abertas; areostilo, com colunas mais distanciadas do que convém; e eustilo, com uma justa distribuição de intervalos. Para as espécies picnostilo e sistilo, seguiam desvantagens quanto ao seu uso, pois os espaços entre as colunas eram insuficientes para a passagem das pessoas, e elas tinham que seguir em filas; além disso, também prejudicava a visão e a circulação dentro dos templos. Quanto ao templo diastilo, as dificuldades deviam-se ao fato de as arquitraves partirem-se por causa da magnitude dos intervalos das colunas. Nos areostilos, tem de se colocar traves de madeiras inteiriças, não de pedra. Para ele, o templo eustilo tinha disposição mais louvável e possuía uma lógica bem ordenada para o uso, aspecto e solidez.
     Vitrúvio ainda cita Hermógenes e suas novas soluções na disposição dos templos que pouparam nas despesas e nos trabalhos e criaram uma nova forma de circulação em volta da cela.
     Sobre a relação entre o diâmetro e a altura das colunas, entre  os intercolúnios e a espessura dos fustes, o sistema de contraturas das colunas e suas êntases, descreve cada uma das espécies e fala sobre a aplicação das proporções.
     Os fundamentos das construções eram escavados a partir do chão firme até o terreno sólido, preenchendo  os espaços com concreto o mais consistente possível. Acima das fundações, eram construídas paredes com a mesma largura mais metade da espessura das colunas que ergueriam-se por cima; esses muros são chamados estereóbatas. Mas, se o chão firme não fosse encontrado pelo fato de o terreno ser de aluvião profundo ou paludoso, então escavava-se e drenava-se o local. Lançadas as fundações, eram dispostos os estilóbatas, sobre os quais colunas. Os degraus somados deveriam ser sempre ímpares, pois partindo da ideia que se sobe o primeiro degrau com o pé direito, também seria este a atingir a parte superior do templo primeiro. Concluídas essas coisas, colocavam-se as espiras das bases das colunas, que deviriam ter tanto de largura como de comprimento um de diâmetro e meio de coluna. Dispostas as espiras, eram colocadas com auxílio do fio de prumo, a partir da respectiva base, as colunas medianas do pronau e da parte posterior.

                     A partir daí, pode-se perceber uma preocupação de Vitrúvio em ser bastante descritivo quanto a disposição dos capitéis, volutas, espistílios, arquitraves e frisos, cornijas, frontões, entablamentos, gárgulas e inclusive, as estrias das colunas. Ele faz isso utilizando como exemplo os modelos jônicos, que vão ser explicados com mais detalhes no livro quarto. Além disso, a ordem primeira a surgir foi a dórica; a partir desta, nasceu a jônica e depois a coríntia. Reservei-me a descrevê-las, todas, nos comentários do próximo livro.

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Tratado De Architectura II

                   Como continuação a última postagem, hoje falarei um pouco sobre o segundo livro que compõe este tratado. Não obstante, gostaria de destacar que tal livro trata especificamente dos materiais e seu uso. Alguns dos materiais citados estão em desuso atualmente, mas sem o estudo destes não seria possível alcançar o nível de tecnologia que temos hoje. O estudo de materiais me pareceu imprescindível para Vitrúvio, pois foi colocado antes mesmo de questões sociais e políticas da época. Mas, só para contrariar, Vitrúvio começa o livro falando sobre Dinócrates e Alexandre, o Grande.

LIVRO II

     O sonho do arquiteto Dinócrates era a construção de uma nova cidade. "Quando Alexandre se tornou o senhor do mundo", Dinócrates tratou logo de deixar a Macedônia e foi lhe apresentar suas ideias.

 "Planejei dar ao monte Atos a forma de uma estátua viril em cuja mão esquerda tracei as muralhas de uma amplíssima cidade e na direita uma pátera que receberá a água de todas as nascentes que existem nesse monte e da qual será lançada no mar."

     Alexandre aprovou a originalidade da ideia e logo lhe perguntou se haviam campos em volta, para o sustento da própria cidade. Como se concluísse que não havia outra alternativa senão o transporte marítimo, Alexandre descartou o projeto por reprovar o local escolhido. Talvez até mesmo pela sua ousadia, Dinócrates permaneceria junto a Alexandre, seguindo até o Egito. Este, vendo no Egito um local ideal para as ideias de Dinócrates, ordenou que se construísse ali e em seu nome, próxima ao rio Nilo, a cidade de Alexandria.

                   Vitrúvio então se compara a Dinócrates, falando sobre sua aparência e ideias diferentes das dele. Fez isso simplesmente pelo fato de tal tratado ser um presente ao seu Imperador Augusto e, sendo assim, esperava a sua aprovação e recomendação.

     Da descoberta do fogo até a socialização, Vitrúvio mostra como as experiências nestes tempos foram essenciais para o anúncio da arquitetura. Tendo nascido a reunião e a sociedade devido à descoberta do fogo, e reunindo-se muitos no mesmo lugar; tendo a vantagem de andar ereto e não curvado, e usando as mãos e os dedos; podendo trabalhar tudo o que quisessem, começaram então a construir habitações ora cobertas de folhagens, ora escavadas sob os montes e, observando as construções alheias, a cada dia melhoravam as suas formas. Os homens estavam dispostos a imitar e a aprender e mostravam uns aos outros seus conhecimentos, exercitando assim as suas capacidades.
    O primeiro material, e talvez o mais abordado, é a madeira. Vitrúvio fala sobre a  importância da madeira nas contruções primitivas e também como os povos, como os frígios, utilizavam-se do próprio  terreno para construir suas moradias.

"Na nação dos colcos, devido à abundância de florestas, colocadas árvores inteiras horizontalmente à esquerda e à direita sobre a terra, e deixado entre elas um espaço correspondente ao seu comprimento, dispõem-se de outras transversalmente sobre seus extremos, os quais delimitam o espaço da habitação (...) Por sua vez, os frígios, que habitam zonas de planície, desprovidos de madeira, escolhem elevações naturais do terreno, escavam seus interiores e, abrindo caminhos, dilatam os espaços até onde a natureza do local permitir." 

        A madeira era cortada no outono, quando os ventos tornavam as árvores despidas e úmidas, vazias e enfraquecidas e também com pouca densidade. As árvores, diferentes umas das outras, tinham suas especificidades, como foram citadas: o roble, o olmo, o choupo, o cipreste e o abeto.  Este último é reverenciado por ser de elemento terreno ( teoria dos quatro elementos: terra, água, ar e fogo), não pesado e regulado por elementos mais leves. O abeto não cede nos vigamentos, sendo assim, ótima madeira estrutural. O olmo e o feixo não têm tanto vigor quanto o abeto, devido ao peso da umidade e rapidamente se encurvam, mas se deixados secar ao sol o retirada sua seiva tornam-se mais duros, sendo usados em travamentos. O cipreste, tendo abundância em água e distribuição igual dos outros elementos, costuma-se encurvar-se ao longo do tempo nas obras, mas contrariamente, mantem-se sem falhas. Por fim, em seu capítulo sobre madeiras, cita o larício, madeira utilizada para evitar incêndios nas insulae.

                    De fato, os incêndios continuaram acontecendo até muito tempo depois deste livro. Cidades inteiras como Londres, foram destruídas várias vezes, e ainda hoje acontece, nas favelas, a destruição de vários barracos de madeira pela ação do fogo. É claro que não vamos discutir agora a ocupação inadequada do solo, a falta de energia elétrica nas comunidades (fato que leva ao uso de velas para iluminação), mas deixemos nos levar por essa base de conhecimento, que antes mesmo do nascimento de Cristo, já nos indicava os usos corretos dos materiais... Fica claro que poderíamos estar fazendo mais por nós mesmos.

      Para Vitrúvio, era possível progredir mediante vestígios de antigas criações dos edifícios e, caminhando gradualmente das edificações até as outras artes no horizonte, e então os homens passariam de uma vida selvagem à uma humanidade civilizada.
     Os materiais adequados à construção eram escolhidos numa imensa gama de variedades pelas suas diferenças de uso e pelas qualidades que cada um poderia agregar ao edifício. O arquiteto então, como ainda cobra-se hoje e justamente, deveria conhecer os materiais e saber diferenciar seus tipos e usos.
     Os tijolos crus deveriam ser confeccionados a partir de terra esbranquiçada com abundância em argila de terra vermelha, pois assim apresentariam consistência, leveza e argamassariam-se facilmente; a confecção deveria ser na primavera ou no outono, para melhor secagem e deveriam ser utilizados somente dois anos após a sua fabricação, pois assim verificava-se a sua qualidade. Existiam três espécies de tijolos: lydion, pentadorum e tetradorum. Vitrúvio ainda cita  meios tijolos e tijolos de certa região da Hispânia, que ofereciam grandes utilidades, porque nem eram pesados nas construções e nem se desfaziam quando haviam tempestades. Isso acontecia porque a terra de que eram feitos era esponjosa.
     Sobre as areias, destaca que a melhor areia será aquela que fizer um estridor ao ser friccionada, e não a que for terrosa. Porém adverte que as areias marinhas não são indicadas para obras. As espécies de areias fósseis são: negra, branca, vermelha e carbúnculo.
    Após tratado das areias, recorre à cal, que deveria ser queimada a partir de pedra branca ou tufo calcário; sendo a mais útil nas estruturas a que for de pedra sólida e nos revestimentos a de pedra porosa.
    Mas uma vez, Vitrúvio destaca a importância de conhecer os diferentes tipos de materiais, justificando sua afirmativa com a seguinte observação: encontra-se em geral na terra qualidade e variedade de espécie díspar, conforme a variedade das regiões.
     Sobre as pedreiras, das quais se extraem e aprontam as pedras esquadriadas, fala sobre seus diferentes tipos e usos. As pedras macias, por exemplo, têm a vantagem de poderem ser trabalhadas logo após a sua extração, já na obra. Resistem ao peso da estrutura se usadas em locais cobertos, mas se usadas em locais descobertos são destruídas pela geada e  pelo gelo do inverno.
     Os sistemas construtivos utilizados eram o reticulado, e o antigo, chamado incerto.

"Deles, o mais elegante é o reticulado, mas potencializa a abertura de fendas, porque apresenta assentamentos e junturas que se desagregam para todos os lados. Por sua vez, as pequenas pedras de disposição irregular, assentes umas sobre as outras, proporcionam uma estrutura deselegante, porém mais segura que a reticulada."
 No entanto, mais adiante diz: "Com efeito, nenhuma parede feita da maleável argamassa de pedra miúda poderá, com o decorrer do tempo, resistir à ruína."

    Nota: o prazo de uso de uma construção antiga era de 80 anos. Atualmente, a ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) elaborou uma norma que fala sobre a duração das construções em si. Na norma apresentada,  diz-se que cada construção deve durar, no mínimo, 50 anos. Ora, para um padrão atual até que não estamos mal, mas será que com tecnologias tão avançadas não poderíamos ao menos nos igualarmos às obras antigas? Será mesmo que as construções só duram 50 anos ou é tudo uma jogada de marketing? Afinal, o mercado imobiliário é um dos que mais cresce no Brasil. Seja como for, é importante pensarmos como podemos contribuir. Talvez esta leitura seja a mais importante de todas, pois conscientiza sobre algo que é real, que é literalmente concreto.





sexta-feira, 8 de abril de 2011

Tratado De Architectura I

                Como quem deseja causar boas primeiras impressões, procurei começar inevitavelmente pelo começo. E, disposta a discutir conceitos, e se preciso, mudá-los, escolhi ninguém menos que Vivtrúvio: engenheiro militar e arquiteto que viveu, como ele mesmo diz: "no tempo de Augusto". Na verdade, não se pode afirmar em que data Vitrúvio nasceu nem faleceu, e nem ao menos seu nome completo. Nossas únicas informações sobre ele estão neste livro que vamos comentar.
                Tal sua obra intitulada De Architectura, atualmente traduzida para vários países, é o primeiro livro que se tem notícia que fala sobre a tratadística arquitetônica antiga. O tratado que é constituído por uma coleção de 10 livros foi descoberto em 1414 e a partir daí passou a servir como interlocutor não só para arquitetos, mas também para músicos, pintores e escultores, do que se passara na antiguidade clássica. Abaixo o Homem Vitruviano, desenho feito por Leonardo Da Vinci, baseado em textos vitruvianos. 


LIVRO I

Preocupado em falar sobre o ofício do arquiteto e sobre as características dessa arte, Vitrúvio ocupa todo o primeiro livro com tais assuntos, acrescentando informações sobre as cidades fortificadas e sobre as muralhas, quesito imprescindível para a defesa das cidades naquela época.

     Para Vitrúvio, a ciência do arquiteto agrupa muitas disciplinas e saberes, estando presente em todas as obras de outras artes. Nasce da prática, que resulta da criação contínua e experiêcia; e da teoria, que é aquilo que pode explicar as coisas criadas. Para ele, a teoria e a prática são dependentes entre si para que haja um bom profissional. O significado e o significante se encontram também na arquitetura, como em tantas outras artes e fazem parte da conceituação da profissão, na qual ele diz: "Convém que ele seja engenhoso e hábil para a disciplina; de fato, nem o engenho sem a disciplina nem esta sem aquele podem criar um artista perfeito." O arquiteto então, deveria ter conhecimentos de literatura, desenho gráfico, geometria, história, filisofia, música, medicina, direito e também de astronomia. Deveria dispor de conhecimentos musicais para dominar as leis harmônicas e matemáticas, e além disso, efetuar os cálculos de direcionamento de balistas, catapultas e escorpiões (três máquinas de guerras, descritas em outro livro do mesmo tratado).
     Quando se trata de quem deveria ser arquiteto, Vitrúvio defende que arquitetos não deveriam ser formados de uma hora para outra. Arquitetos deveriam ser aqueles que desde crianças foram insentivados à arte e subiram seus correspondentes degraus até que "atingissem o altíssimo templo da arquitetura". Na formação do arquiteto, não se deve surpreender que a natureza permita conhecer tão grande número de doutrinas, mas compreender que estas estão interligadas, e por isso, é possível que a memória as contenha.
Na verdade, o arquiteto deve abranger uma cultural geral, ou seja, não deve ser tão músico como Mozart, mas também não deve desconhecer totalmente a música. E então, é o momento em que Vitrúvio chega a uma conclusão: a impossibilidade de atingir a perfeição.

                                    "E assim, como como os arquitetos não podem exercer um perfeito domínio em todas as coisas, também nenhum daqueles que individualmente adquirem especializações entre as outras artes consegue atingir o sumo principado do louvor."


     Em suas definições de arquitetura, Vitrúvio diz de ordenação, disposição, euritmia, comensurabilidade, decoro e distribuição. A ordenação define-se como a justa proporção das partes da obra; a disposição como a colocação adequada das coisas e o efeito estético da obra;  a euritmia corresponde à forma exterior elegante, compreendendo as relações de proporção entre altura,  largura e comprimento; a comensurabilidade consiste no conveniente equilíbrio entre os membros da própria obra e na correspondência de uma determinada parte; o decoro é o aspecto irrepreensível das obras, dispostas com autoridade através de coisas provadas, de costume, ou então naturalmente; a distribuição é a repartição apropriada dos meios o do solo, como um equilíbiro econômico nas despesas da obra.

     Para ele, a arquitetura se divide em três partes iguais. São elas: a edificação (recintos fortificados e públicos), a gnomônica (levantamento dos edifícios privados) e a mecânica. Segundo ele, essas coisas deveriam ser realizadas de modo a que se tenham presentes os princípios de solidez, funcionalidade e beleza (firmitas, utilitas e venustas). O princípio de solidez estará presente quando for feita a escavação dos fundamentos até o chão firme;  o da funcionalidade, por sua vez, estará presente quando houver a adequação do uso dos solos; e o de beleza, será atingido quando o aspecto da obra for agradável e elegante e houver comensurabilidade.
   No que diz respeito às cidades, Vitrúvio preocupou-se em mostrar como se faz a escolha dos lugares para a instalação, destacando a importância de conhecer as pastagens e os animais, uma estratégia para saber se o lugar é propício ou não para a caça, agricultura, extração e se o clima é o ideal para o ser humano. A partir dessas observações e também do terreno, que deveria facilitar a defesa e a construção de muralhas, era possível escolher o lugar. Para ele, o lugar deveria ser o mais saudável possível, evitando-se os pântanos e evidenciando um "quadrante" temperado, ou seja, nem quente nem frio. Fala também sobre a construção das muralhas, das torres e sua proteção, fossos e alicerces. Sobre os materiais, faz questão de dizer que não deveriam ser definidos de antemão, pois não dispomos dos recursos que desejamos. Logo, os materiais utilizados seriam aqueles que estivessem disponíveis, assim como acontece em alguns lugares atualmente, devido a preço, oferta ou a qualidade oferecida.
   Sobre a distribuição das praças e das ruas, Vitrúvio analisa pormenorizadamente os ventos e seus sentidos. Estuda a sua natureza e sua influência na saúde da população, para a partir daí definir o traçado das ruas e praças. Propõe então orientações diferentes das ruas e ventos. Devemos perceber, que já na antiguidade se começava a pensar em técnicas de conforto ambiental e métodos para driblar fenômenos naturais e garantir saúde e conforto para a população.
   Ainda dentro dos estudos da cidade, Vitrúvio antecipa sua discussão sobre os templos e diz que eles deveriam estar em lugares adequados aos sacrifícios.

"Um lugar onde ninguém vá com frequência, a não ser quando necessário para o sacrifício; esse lugar deverá ser honrado com piedosa pureza de costumes."


                     E assim, Vitrúvio termina o primeiro livro, prometendo mais explicações sobre os templos nos livros 3 e 4, em que o assunto será tratado como principal. Podemos levantar questões de vários assuntos desta leitura, dentre eles, como as questões arquitetônicas não mudaram muito desde aquele tempo até os dias atuais. Na verdade, sempre houve preocupação com a segurança, com o conforto e com a organização das cidades propostos pela arquitetura e pelo urbanismo também, por que não? Vale a pena constatar, que com o passar dos anos, surgiram novas questões e mudanças, tanto climáticas quanto sociais, que dificultaram ainda mais o trabalho do arquiteto, e talvez até o tenha tornado mais importante do que já era. Mas ainda precisamos avançar e aprofundar pesquisas em tais campos para que daqui a algum tempo não seja tarde demais. Os problemas das grandes cidades estão aí. Sempre estiveram. Cabe a nós projetar SOLUÇÕES EFICAZES para que mesmo que o problema volte, ele seja estancado logo no seu início.


"Quando eu pensava que sabia todas as respostas, veio a vida e mudou todas as perguntas."